Diocese de Anápolis

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Homilia na Missa do Crisma: Servos da Misericórdia

Homilia 5 feira 2016

Quinta-feira Santa – Missa do Crisma
(23 de março 2016)

Queridos, em Cristo, Irmãos e Irmãs.
Sacerdotes, diáconos, religiosos e religiosas,
Seminaristas, povo de Deus.
 
O nosso “encontro de Cenáculo”, reunidos entorno da mesa do altar, neste dia festivo de hoje, acontece no Ano Santo da Misericórdia: “Misericordiosos como o Pai”. É uma boa sugestão de considerar o nosso ministério sacerdotal sob o aspecto da Misericórdia.
 
1. Rosto misericordioso da Igreja
 
Pelo Magistério dos últimos anos percebemos que a renovação da Igreja passa pelo caminho da misericórdia.

Assim, abrindo o Concílio Vaticano II, São João XXIII dizia: “Esposa de Cristo prefere usar o remédio da misericórdia em vez de empenhar as armas do rigor”.

O Beato Paulo VI, no seu “Pensamento sobre a Morte”, revelava o fundamento da sua vida espiritual na síntese proposta por Santo Agostinho: “ Miséria e Misericórdia. Miséria minha, misericórdia de Deus. Que eu possa pelo menos honrar que Tu és, o Deus da infinita bondade, invocando, aceitando, celebrando a Tua dulcíssima misericórdia”.

São João Paulo II, propagador da devoção da divina misericórdia, a quem devemos a instituição da Festa da Misericórdia, enriqueceu o horizonte da teologia e da espiritualidade com a encíclica “Dives in Misericordia”, na qual afirmou que a Igreja vive uma vida autêntica quando professa e proclama a misericórdia, o mais valioso atributo de Deus.

Também o Papa Bento XVI falou sobre este assunto no seu magistério: “A misericórdia é na verdade o núcleo central da mensagem evangélica (…). É o próprio nome de Deus, o rosto com o qual Ele se revelou na antiga Aliança e plenamente em Jesus Cristo, encarnação do Amor criador e redentor. Este amor de misericórdia ilumina também o rosto da Igreja e se manifesta seja pelos sacramentos, em especial o da reconciliação, seja pelas obras de caridade, comunitárias e individuais. Tudo o que a Igreja diz e faz manifesta a misericórdia que Deus nutre pela a humanidade”. Perguntado sobre o que pensa a respeito do magistério do Papa Francisco centrado na misericórdia, o Papa Bento avaliou: “é a misericórdia que nos move para Deus. Somente lá, onde existe a misericórdia, termina a crueldade, acabam o mal e a violência. O Papa Francisco está totalmente de acordo com esta linha de pensamento. A sua prática pastoral se expressa exatamente no fato que nos fala constantemente da misericórdia de Deus”.

E, finalmente, o Papa Francisco, na Bula “Misericordiae vultus”, assim descreve o mistério de Deus e a forma da nossa fé: “Jesus Cristo é o rosto da misericórdia do Pai. Com sua palavra, os gestos e toda a sua pessoa, Jesus de Nazaré revela a misericórdia de Deus. Precisamos sempre contemplar o mistério da misericórdia. É fonte de alegria, serenidade e paz. É condição da nossa salvação. Misericórdia: é a palavra que revela o mistério da Santíssima Trindade. Misericórdia: é a lei fundamental que mora no coração de cada pessoa, quando vê com olhos sinceros o irmão que encontra no caminho da vida. Misericórdia: é o caminho que une Deus e o homem, porque nos abre o coração à esperança de sermos amados para sempre, apesar das limitações do nosso pecado”.

“A misericórdia é o doar-se de Deus que acolhe, que se dedica a perdoar (Papa Francisco).

Sim, o caminho da Igreja é o caminho da misericórdia. O tempo da Igreja é o tempo da misericórdia – “hospital de campo de batalha”, expressão do Papa Francisco.

2. “Miserando atque eligendo– olhando com misericórdia o elegeu.

Queridos sacerdotes e diáconos, nós, chamados a sermos ministros de Deus e da Igreja, somos antes de tudo objeto do olhar misericordioso de Deus. Por ter-nos chamado, Deus manifestou a sua compassiva predileção por cada um de nós. Na sua misericórdia está a nossa salvação.  Salvos, somos instrumentos de salvação. Amados, somos espelho do amor de Deus para os que Deus também olha com ternura.

É saudável e atual o costume antigo de o confessor, antes de atender as confissões do fiéis, ele mesmo se confessa. Pratica a humildade, sente a “vergonha do pecado”, experimenta a misericórdia do Pai, para depois ter maior compreensão e atitude compassiva para com os penitentes.

No seu livro entrevista, intitulado “O nome de Deus é Misericórdia”, o papa Francisco justifica a escolha do lema do seu episcopado e pontificado: “Miserando atque eligendo”. Afirma gostar do capítulo 16 do Livro do Ezequiel, onde se compara a história de Israel a uma menina cujo cordão umbilical não foi cortado e que foi deixada em meio ao sangue, abandonada. Deus a viu se debatendo no sangue, a limpou, a ungiu, a vestiu e, quando ela cresceu, a adornou com sedas e joias. Mas ela, não valorizou o que recebeu. Envolveu-se em imoralidade, pagando ela própria os seus amantes. No entanto, Deus não esqueceu a sua aliança e a colocou acima das irmãs mais velhas, para que Israel reconhecesse a amplitude da paciência de Deus e se envergonhe da sua pequenez e ingratidão.

Assim somos nós: corremos o risco de esquecermos a nossa pequenez, atribuirmos a nós mesmos a graça da vocação. Porém, a lembrança da nossa pequenez e a experiência de sermos tocados pela misericórdia nos faz humildes e, então, aptos servidores da Misericórdia divina.

3. Servos da Misericórdia

Ser servo da Misericórdia é ser seu espelho. Este papel de sacerdote como espelho da misericórdia descreve-o o Papa partilhando a sua experiência: “Tinha dezessete anos. Senti-me acolhido pela misericórdia de Deus quando me confessei com o Pe. Carlos Duarte Ibarra (…). Ainda me lembro que, depois do seu funeral e do seu sepultamento, quando voltava a casa, senti como se tivesse sido abandonado. E chorei naquela noite, tanto, escondido em meu quarto. Por que? Porque havia perdido uma pessoa que me fazia sentir a misericórdia de Deus, aquele “miserando atque eligendo”, uma expressão que naquela ocasião ainda não conhecia e que depois escolhi como lema episcopal”.

Nós fomos escolhidos e ungidos para sermos servidores da misericórdia. A Misericórdia divina precisa das nossas mãos, das nossas palavras, dos nossos olhares, dos nossos sentimentos, dos nossos gestos para se revelar aos amados de Deus. Somos apóstolos, missionários, confessores, promotores de obras de misericórdia. É uma grande dádiva e maior ainda a missão. Por meio de nós passa o poder divino da misericórdia capaz de transformar as vidas. Somos, “Alter Christus”, mas também “Altera Misericordia”.

São João, o discípulo amado, chama Deus de Amor. Isto é mais do que dizer que Deus ama, como se amar fosse uma das suas atividades. Não, o Amor é a sua essência. Assim, dizendo que Deus é Misericórdia, queremos dizer mais do que dizer que Ele é misericordioso; é um dos seus atributos. A Misericórdia é a essência de Deus.

Nós, definidos como servos da Misericórdia, a servimos, sim, com as obras e funções que realizamos, mas acima de tudo com o que somos, identificados com o estilo de vida que manifesta o Deus da Misericórdia.

Queridos irmãos Sacerdotes. Durante o tempo da Quaresma percebi a vossa dedicação ao Deus Misericórdia especialmente no exercício do ministério da reconciliação. Confissões intermináveis, até mais de meia-noite. E nas vossas palavras e rostos cansados impressa a alegria de servir e de ver tantas almas devolvidas à graça de Deus. Cada confissão é uma vida exposta diante de nós. Arrependimentos sinceros, lágrimas nos olhos, desejo da libertação. É como uma criança indefesa colocada nas nossas mãos. Grande graça! Sublime tarefa!

Além do contexto da confissão, encontramos pessoas feridas pelas circunstâncias da vida. Não podemos apenas julgar, mas com coração misericordioso, nos perguntar o que podemos fazer para resgatar as pessoas da degradação, do sofrimento, da ausência de Deus. Devolver a dignidade e a felicidade pelo poderoso atrativo da misericórdia.

Irmãos e Irmãs, esta Missa do Cenáculo do Senhor expressa o louvor a Deus pelas nossas vidas, generosidade, serviços. Que a minha e a vossa pequenez sirvam para o nome de Deus Crescer, para que o Amor seja amado e a sua Misericórdia sempre exaltada. Que a Virgem Maria, “Mãe de Misericórdia, vida, doçura e esperança nossa” nos ajude ser misericordiosos como Jesus e como o Pai.

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo.

+ João Wilk,
Bispo Diocesano

 

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