10/10/2013
Homilia
A Palavra de Jesus neste vigésimo sétimo Domingo do Tempo Comum nos fala de dois temas: “Se vós tivésseis fé” e “Somos servos inúteis”.
Os Apóstolos pediram a Jesus uma graça: “aumenta a nossa fé”. Já atraídos para o seguimento de Jesus pela beleza de suas mensagens e poderosos sinais milagrosos, pelo jeito simples e amoroso de tratar a todos, perceberam que o foco de Jesus não é voltado para essas coisas; vai mais além. Tudo isso era apenas o caminho para algo mais importante: a compreensão do mistério da pessoa de Jesus e do Reino de Deus a ser doado a todos. As coisas visíveis (milagres) eram fáceis de compreender e admirar. A visão do mistério demorava a amadurecer. “Aumenta a nossa fé”. Sabiam que para a compreensão das coisas superiores não basta boa vontade, a inteligência, o desejo. Eles precisavam de um dom especial que só Jesus podia dar, de uma graça para poder dar mais um passo na compreensão de Jesus e da sua oferta.
Jesus, então, lhes responde em termos figurativos, pela imagem de uma árvore que se muda de lugar pela ordem de quem tem fé. Lembremos, é uma figura, uma expressão simbólica, comparativa, parecida com muitas daquelas que nós usamos para expressar um pensamento ou um juízo. A fé em si não é mágica, não é de caráter físico nem geográfico. A “geografia da fé” é a alma, o coração, a vontade da pessoa. É verdade que a fé tem sua dimensão visível em forma de milagres. Jesus fez muitos milagres. Deus concedeu o dom de fazer milagres aos santos. Mas é preciso compreender que Jesus não fez milagres para fazer um espetáculo. A sua preocupação não era impressionar multidões com seu poder extraordinário e tirar vantagem sobre os chefes do povo. O seu foco era pregar o Reino de Deus e trazer as pessoas a aderir a este Reino da salvação. Os milagres entravam nesta lógica: comprovavam que ele é enviado de Deus e que nele está a verdade.
Nós também dizemos: “Senhor, aumenta a nossa fé”. E Jesus nos responde: “Se tivésseis fé…” A fé forte não se manifesta no domínio sobre as coisas externas, nem se identifica com os sentimentos de consolo ou emoção. A fé é dom de Deus, é graça, e já está em nós, porque nos foi dada no Batismo. Nós a temos dentro da nossa alma. Aumentar a fé significa colaborar com a graça batismal. Deus está aberto a nos fazer mais unidos a Ele, mas precisa da nossa colaboração e da nossa decisão.
A fé é a consciência de que Deus nos quer bem e nos quer junto dEle. É também uma resposta nossa, uma busca constante, como a dos Apóstolos, de querer algo mais, de crescer. Deus nos acompanha sempre no caminho espiritual, mas é preciso o nosso engajamento. O que é que nós fazemos para que a nossa fé seja mais forte? Conhecemos a vontade de Deus? Conhecemos a doutrina de Jesus? Conhecemos a sua Igreja? Conhecemos o que praticamos nos ritos sagrados?
A fé aumenta quando nos aplicamos a conhecer as realidade sobrenaturais: a doutrina, o Catecismo, a lei moral, como aplicação na vida da verdade e da vontade de Deus. A fé aumenta quando nos fazemos parte viva da comunidade dos crentes, participamos da Eucaristia, temos vida sacramental. A fé aumenta quando cultivamos a virtude da piedade e da oração. A fé aumenta quando praticamos a caridade. Fazer isto, é caminhar passo a passo com Deus que, na medida em que caminhamos, nos dá novas graças, novas forças para a caminhada e novas conquistas.
Mas o que é a fé forte? Consiste na força da decisão por Deus, de conversão radical. Conhecer Jesus nos abre para um novo estilo de vida: de pensar, de decidir, de agir. Se temos a fé forte, sabemos transplantar-nos, p. ex., de um solo de vícios e plantar-nos no ambiente de retidão, de caridade, afirmar a nossa dignidade dos filhos de Deus num lugar desfavorável, ser agente de transformação. Sair da nossa comodidade para sentir com os outros. Arrancar a nossa mente de tantas doutrinas falsas a respeito do valor do ser humano, da vida, da família, para plantar a nossa consciência e a nossa convicção na verdade de Deus, com convicção e radicalidade.
“Somos servos inúteis”, porque “fizemos o que devíamos fazer”. A norma do cristão é o amor. O amor é gratuito, oblativo, capaz de se sacrificar pelo bem do outro. Não calcula a vantagem própria antes de fazer o bem, antes de beneficiar o outro. Fica contente em ver o outro crescer, em ver a verdade crescer, em ver o bem acontecer pela sua causa, sem que ninguém saiba quem foi. O amor gratuito é o dever de quem ama Cristo. Somos servos por amor. Somos “empregados” do amor. O nosso “patrão” é o amor de Jesus. Fazer o que devemos fazer e deixar a recompensa a critério do Patrão, que é justo e não falha em retribuir.
Continuemos pedindo: “Senhor, aumenta a nossa fé”, na entrega confiante na bondade e sabedoria de Deus. Sejamos discípulos de Jesus, façamos tudo em atitude de servir, obrigados por ninguém, a não ser por amor que é a identidade do cristão.
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo.
Dom João Wilk, OFMConv.
Bispo de Anápolis – GO