Parece um dia qualquer, a sucessão das horas, o cantar dos pássaros, o luzir do sol, a normalidade da criação, o tempo comum e rotineiro. “Deus se faz carne”, adentra na nossa realidade ordinária, se faz presente no nosso cotidiano, participa da nossa história. Uma presença marcada não pela euforia ou por gritarias, não com pompas e músicas, mas assinada pelo silêncio da criação, o estupor angelical e a contemplação de meros expectadores que mal sabiam da grandeza e do alcance daquele maravilhoso evento. O interesse divino pela criação movido pelo seu eterno amor que transborda em graça, faz com que Deus saia do seu comodismo divino e se adentre na crueza e dureza humana, experimente o calor e o frio, a fome e a dor, o sorrir e o chorar. A encarnação revela um completo abismo infinito do amor de Deus para com a humanidade, que só e contemplado no extremo e austero sossego do estábulo. E na quietude do ordinário, na naturalidade de um presépio, no silêncio de um “berçário” improvisado que se discerne a eloquência do momento, a grandeza do amor encarnado, o real sentido do Natal.
A euforia toma conta das festas de final de ano, correrias para comprar presentes, enfeites para todos os lados, clima de algazarra, bebedeiras e comilanças, tudo para expressar alegria, tudo para celebrar e divertir, para se sentir bem e feliz…. Mas diante de tantas coisas, preocupações e afazeres, corre-se o risco de esquecer do verdadeiro sentido da festividade, de diluir o Natal em uma festa de final de ano, tão pagã e absurda quanto fútil e mercantil. Por mais que muitos tentem associar o dia do nascimento de Jesus com o dia pagão do deus sol, a nossa fé cristã e católica santifica este dia dando a real importância à celebração da encarnação por meio da nossa oração pessoal, participação da Santa Missa e caridade fraterna. Jamais podemos dissolver a festa do Natal nas banalidades das festas pagãs, o principal é Aquele a quem celebramos e não aqueles que celebram ou festejam. O centro do Natal está na Pessoa de uma criança, inocente, indefesa e frágil; uma criança que se assusta pelas gritarias, chora de fome e dorme numa desconfortável e improvisada manjedoura. O retrato mencionado nos relatos bíblicos, a imagem do nascimento de Jesus representado nos presépios de todo mundo revela uma característica poucas vezes mencionada na festa do Natal: é necessário fazer silêncio para contemplar a encarnação. Assim como ao nos aproximar de um berçário, ou do quarto de uma criança recém-nascida se pode vislumbrar um cartaz pedindo silêncio, da mesma forma, para admirar Deus que se faz carne é necessário fazer silêncio. Só o silêncio poderá revelar o Amor encarnado, feito homem, Deus entre nós.
A alegria da festividade as vezes pode nos distrair do essencial; o materialismo e consumismo de uma sociedade superficial pode reduzir o Natal na festa do Papai Noel, cheio de presentes, músicas e enfeites (fazem parte, mas não são essenciais). Só o silêncio poderá revelar a centralidade da celebração, o sentido da oração e a profundidade da festividade do Natal. O silêncio do presépio nos faz ver que não se precisa de muito para se encontrar a felicidade, a verdadeira alegria do Natal não vem do ter muitos presentes, ou enfeites, ou das comidas e bebidas, mas da presença de Deus entre nós. A eloquência escondida atrás do silêncio nos faz contemplar a Encarnação, cantar Gloria com os Anjos e admirar a grandeza na simplicidade, a riqueza na pobreza e a felicidade na austeridade.
Padre Carlito Bernardes Paróquia Santa Terezinha do Menino Jesus