Desde o dia 25 de dezembro, as paróquias da Diocese de Anápolis são visitadas com uma graça especial: os diversos galhos de Folia de Santos Reis iniciaram seu giro no presente ano.
A devoção, originada no tempo da evangelização nos recônditos de Minas Gerais e Goiás, ainda hoje encanta, promovendo a evangelização e a divulgação dos Mistérios da Redenção nas mais diversas partes do país. Os primeiros missionários a evangelizar nessas terras, ao notarem a simplicidade e a musicalidade do povo do interior de Minas e Goiás, começaram a cantar a fé. Em melodias simples, marcadas pelas notas G, C e D, a iniciação catecumenal era traduzida de modo que ficasse na mente de todos que a escutassem. Aprendiam, por exemplo, os devotos dos Santos Reis, que a caridade era uma virtude e que a virtude é o que dá “vida e saúde”. Isso formava o imaginário de quem acompanhava os giros, refletindo em seu modo de ser e agir ao longo do ano.
Mistagogicamente, a Folia de Reis busca representar a jornada dos Reis Magos em direção ao doce encontro com o Menino Deus. Com forte base evangélica (fundamentada em Mt 2,1-11), o giro (nome dado à caminhada da folia, visitando as casas dos devotos) é, de fato, um caminhar sob uma guia. Naquele tempo, os Magos seguiam a Estrela de Belém; hoje, os foliões seguem a Bandeira (que também é chamada de guia). A Bandeira da folia é o centro da devoção: nenhum folião se atreve a caminhar à sua frente. É ela quem primeiro entra em cada casa; é ela que, tendo sido abençoada por um sacerdote, leva o milagre a quem a recebe com fé e acolhe tal sacramental.
Ao chegar à casa dos fiéis, os foliões seguem um rigoroso ritual, baseado na tradição recebida desde a infância, quando acompanhavam os giros de folia. Cantam para saudar o dono da casa, saudando também o arco de ramagem que marca a entrada do lugar onde a folia chega. Pedem a benção de Deus para os lares e para aqueles que trabalharam na organização do almoço, lanche ou pouso que os acolherão. Em seguida, encaminham-se ao Presépio montado no interior da casa do dono, onde, de joelhos, se prostam, imitando o gesto dos Magos diante do Menino Deus. Adoram, com versos e melodias, o mistério da Redenção, atualizando o nascimento sagrado diante dos olhos de quem observa.
As saudações são a marca da folia. Como regem os bons modos de qualquer cidadão, os foliões cantam versos de augúrio para quem os acolhe. Isso é especialmente notado diante do presépio, onde o capitão (folião de guia ou embaixador) canta anunciando cada santo que lá se encontra, saudando também as velas que o iluminam e os animais que o adornam. Cantam ao rosário de Maria, à Palavra de Deus e a todos os enfeites que embelezam e dedicam devoção à Lapinha de Belém. Esse é o modo dos foliões expressarem sua gratidão ao lar que os recebe, e também a maneira de deixarem seus ensinamentos. Cantam o nascimento; nesses versos, o capitão transmite toda a magia daquela noite santa, onde a natureza silenciosa e gelada acolhia em seu seio o orvalho celestial, vindo das entranhas de Maria, das entranhas da Trindade: o próprio Verbo Encarnado.
Para quem acompanha um giro de folia, não faltam momentos de emoção! Desde o levantar da Bandeira (primeiro verso cantado para o início do giro), até a recolhida (momento final da folia, quando os foliões entregam seus trabalhos diante do Presépio), não faltam lágrimas que regam a devoção dos que acompanham a folia. E qual é o motivo da emoção? A Folia de Reis tem um poder nostálgico muito forte. Ela resgata no coração do devoto lembranças e sentimentos de tempos vividos, de pessoas que já partiram e de situações onde, de fato, a vida era diferente. Quem ouve a batida de uma caixa (instrumento de percussão da folia) parece ter o coração “afinado” no ritmo de suas batidas. Quem escuta a mística do canto do capitão parece sentir uma lança de emoção ferindo seu coração.
De fato, esse é o sentimento do Natal! A simplicidade de um Deus que se fez homem para salvar a humanidade deve questionar o modo de viver de cada um de nós. Deus, que é tudo, esvazia-se de si mesmo e se faz quase nada, para salvar o homem, que é nada e, muitas vezes, quer fazer-se tudo, assumindo uma postura de superioridade sobre os irmãos e sobre os demais.
A simplicidade do Natal do Redentor acompanha cada passo dos diversos ternos de folia que giram no território de nossa Diocese. São homens e mulheres, das mais diversas classes sociais e graus de escolaridade, que entre os dias 25 de dezembro e 6 de janeiro (ou até um pouco mais) param seus afazeres ordinários para caminhar atrás da Bandeira, num giro de folia. Como lembrava um sacerdote folião: “Os devotos caminham nesta vida atrás da Bandeira dos três Reis para, no fim da vida, alcançar a graça do céu, a bem-aventurança eterna”.
Texto: Marcos Vinícius Santana