Uma figura de Jesus me recebe ao entrar na sala do Nário. Não é um Jesus pregado na cruz, como comumente é representado, mas um no qual feixes de luz azul e vermelha saem do peito e cuja mão direita abençoa a todos que entram naquele lugar. Sou informado que se trata de Jesus Misericordioso. A sala é toda tomada de adornos religiosos; é impossível não notar. Nário faz questão de expor a sua religiosidade.
Durante a nossa conversa, ficou claro pra mim o motivo da decoração católica que toma o ambiente. Nário vive a sua fé o tempo todo. Não é possível separar o diácono do gerente, o clérigo do gestor público. Os nortes éticos e morais que regem a vida pessoal de Nário atravessam sua vida profissional.
No nosso primeiro contato, quando o comuniquei que ele seria um dos perfilados em comemoração aos 25 anos da UEG, ele não esboçou muito mais do que um sorriso de canto de boca e já foi logo tratando das questões práticas e logísticas da nossa conversa. Me pareceu, inicialmente, um homem muito calmo e sereno, de poucas palavras, talvez até um pouco tímido. Já antecipei que esse perfil exigiria de mim um pouco mais em termos de extrair informações do meu entrevistado.
No dia e horário marcados para a nossa conversa, desci até a sua sala, no térreo da administração central em Anápolis e o encontrei plácido em sua mesa. Terminava uma conversa com uma servidora do setor. Me chamou a atenção vê-lo novamente de gravata. Não me lembro de ter visto outros gerentes seguindo um código de vestimenta tão estrito assim aqui na UEG. Fiquei com isso na cabeça.
Entramos, nos sentamos, colocamos o microfone de lapela e ele me olhava como quem aguardava direções. Eu explico toda a dinâmica para ele, que esse momento é mais uma conversa do que uma entrevista. É mais sobre o que ele quer dizer do que sobre o que eu posso perguntar. Ainda sem resposta, peço para que ele comece do começo.
Nário não é daqui. Filho de baianos, passou a infância e adolescência entre o Paraná e o Pará e escolheu Goiás como casa em 1993. Não passava pela sua cabeça o serviço público. Trabalhava numa indústria do Daia quando uma vizinha o comunicou do concurso da então Uniana e além do apoio moral, também pagou a sua inscrição. Não fosse a vizinha, talvez tivéssemos perdido Nário para iniciativa privada.
Ele lembra com certo saudosismo a sua aprovação. Em função do horário de verão, quase perdeu a hora da prova. Para piorar a situação, estava sem a sua carteira de identidade; havia sido assaltado. Apesar dos percalços, conseguiu fazer a prova. Ficou em terceiro lugar nas provas teóricas. O que fez com que ele ultrapassasse os concorrentes e fosse aprovado em primeiro lugar foi a prova de datilografia, uma habilidade que as gerações mais novas talvez desconheçam. Para ele, tudo isso foi um sinal divino. Tomou posse em fevereiro de 1995 sabendo que, inicialmente, seu salário seria menor do que ganhava na indústria.
Ao ser admitido na UEG, Nário foi trabalhar no Patrimônio. Lembra, com um sorriso no rosto – talvez o primeiro que eu tenha visto dele –, que ficou responsável por contar as carteiras velhas que eram guardadas embaixo da arquibancada do ginásio da hoje UnU Anápolis CSEH. Logo depois, assumiu a função de assistente na coordenação administrativa. Ficou responsável por cuidar da parte financeira da unidade. Passou ainda pelo setor de compras e pela Gerência de Contratos e Convênios. Foi um prelúdio para a função que viria a assumir anos mais tarde e que ocupa até hoje: gerente de Gestão e Finanças.
Ao longo dos últimos quase 30 anos de UEG, Nário cresceu junto com a universidade. Foi aqui que ele se graduou, em 2003, em Gestão Pública, na primeira turma. Fez ainda a sua pós-graduação em Direito Administrativo na Escola de Governo. Ele não esconde sua gratidão e compartilha seus planos de entrar no mestrado em Economia do Setor Público, também pela Escola de Governo.
Nário viveu a universidade em todos os seus momentos. Ele lembra da mudança de paradigma que foi a transição de Uniana para a UEG. Lembra que o trabalho era tranquilo e pacato e que compreender uma nova estrutura e entender que a totalidade do seu trabalho anteriormente passou a ser parte do todo, foi um baque. Ele lembra que o maior desafio foi transformar o foco de olhar local para um olhar de estado.
“A grande importância da universidade é onde ela está mesmo, nos interiores, onde o ensino fica mais próximo dos alunos.”
Nário tem um olhar muito completo da UEG. Ele entende a função descentralizada da instituição de formar o povo goiano onde ele está. “A grande importância da universidade é onde ela está mesmo, nos interiores, onde o ensino fica mais próximo dos alunos”, disse. O mesmo olhar também reconhece os desafios. Nário tem uma visão sobre a qualidade dos cursos, que, segundo ele, precisam ser fortalecidos. Enxerga também a sustentabilidade financeira das unidades.
Eu pergunto a Nário sobre os adereços na sua sala. Ele me conta que nasceu duas vezes, naturalmente e espiritualmente e, com lágrimas nos olhos, diz que Deus o chamou para trabalhar como diácono. Ele lembra que a origem da palavra diácono quer dizer servidor; é aquele que serve o povo de Deus. Então, de certa forma, a sua atuação é de servir, tanto a Deus quanto ao povo goiano.
Para ele, “as palavras convencem, mas o testemunho arrasta”. Assim, ele compreendeu que na UEG ele não deveria pregar, mas viver e ser exemplo. A transparência de Nário salta aos olhos. Seu computador é ligado a uma televisão que fica atrás dele. Portanto, qualquer pessoa que se sente à sua frente, consegue ver a tela de Nário. de maneira ampliada. Ele não tem o que esconder. Seu computador é um livro aberto.
Nário sempre prezou pelo correto, pela retidão. São essas as marcas que ele deixa na UEG. Ele afirma gostar de pagar as pessoas. “A função nossa aqui é pagar. É uma alegria pagar todo mundo”. Fala com orgulho que a instituição não tem mais dívidas com fornecedores.
Quando eu pergunto qual o maior orgulho desse nesses 25 anos, ele se emociona novamente e diz que é ter se formado aqui e ter ajudado tantas pessoas a se formarem. Ele pausa. Dá pra ver que passa um filme em sua cabeça. Ele destaca a oportunidade de poder estudar enquanto trabalhava aqui e como isso foi determinante para sua carreira.
No final da nossa conversa, pergunto o que ele gostaria de ver nos próximos 25 anos da instituição. Ele afirma que gostaria de ver mais cursos sendo criados e mais servidores sendo contratados. Ele quer ver a UEG consolidada e acredita no seu potencial. Sua fala é emblemática: “Principalmente que a gente consiga cumprir o nosso papel no estado”, diz. Ele compreende a função da universidade no seu mais profundo íntimo, que vive e tem razão de ser em função dos alunos.
Nário é claramente um homem de Deus. É uma vida inteira dedicada a servir. E na UEG não é diferente. Nário entende o trabalho como uma missão. Na verdade, é tudo parte da mesma coisa. São os planos de Deus para a vida dele. E que bom que Deus colocou a UEG no caminho do Nário.
Foto: Fábio Silva Texto: Luiz Eduardo Krüger