Diocese de Anápolis

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Quinta-feira Santa – 2012

Os presbíteros e o mundo

Caríssimos em Cristo Irmãos e Irmãs,

A Quinta-feira Santa sempre nos oferece um marco precioso para refletirmos sobre o sacerdócio, a Eucaristia e o serviço que devemos realizar em favor de todas as pessoas. Neste contexto, o presbítero, homem configurado a Jesus Cristo pelo Sacramento da Ordem, tem um papel importantíssimo.

Ao celebrar os 50 anos da abertura do Concílio Vaticano II, gostaria de refletir um pouco com vocês sobre um ponto do Decreto sobre o ministério e a vida dos sacerdotes (Presbyterorum Ordinis). Refiro-me ao ponto 3, o qual fala do ministério dos presbíteros no mundo. Falar de “presbíteros no mundo” poderia até manifestar o desejo de sublinhar coisas evidentes: todos os sacerdotes se encontram no mundo e desenvolvem o seu ministério no mundo. Contudo, não se trata de enfatizar coisas evidentes, mas de lembrar algumas questões relativas a este “estar no mundo”, se trata de dar uma dimensão sobrenatural ao mundo habitado pelo presbítero. Como o sacerdote vê o mundo? Para responder a essa pergunta, cabe citar uma parte do texto do Concílio ao qual nos referíamos anteriormente:
“Os presbíteros do Novo Testamento, em virtude da vocação e ordenação, de algum modo são escolhidos entre o Povo de Deus, não para serem separados dele ou de qualquer homem, mas para se consagrarem totalmente à obra para a qual Deus os assume” (PO 3).

Como o padre não se separa dos demais seres humanos, seus irmãos, em primeiro lugar, ele deveria ver o mundo com simpatia, com amor. Neste sentido, ele deveria imitar o próprio Deus que “de tal modo amou o mundo, que lhe deu seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16). O amor de Deus pelo mundo o levou a entregar o que tinha de mais precioso: o seu Filho amado. O amor do presbítero pelo mundo também o deveria levar a uma entrega cada vez mais generosa, dando ao Senhor o que mais precioso considera em sua vida. O padre é verdadeiramente servo da humanidade. Ele ama o mundo para salvá-lo, para entregá-lo a Deus, para oferecê-lo no altar da sua Missa diária.

Nessa perspectiva de amor a Deus e de amor pelo mundo se entende o celibato sacerdotal, o desprendimento (vida pobre) e a obediência do presbítero. Ele obedece porque quer, tem um coração de pobre como exercício da sua mais plena liberdade e vive o celibato pelo Reino dos céus convencido de que essa maneira de viver o amor é a que mais o realiza como homem, como cristão e como sacerdote de Jesus Cristo. Longe de sentir-se um reprimido nas suas ânsias de amor, ele procura viver toda a expansão de um amor que se entrega continuamente, a imitação de Cristo, seu Mestre, ao qual representa e serve. Homem tomado do meio do povo e devolvido ao povo na nova forma e na nova missão.

O amor ao mundo que o presbítero tem o levará a ter uma visão realista e otimista ao mesmo tempo. Ele não deixa de ver os problemas da humanidade, na qual está profundamente imerso, mas se distingue por ser o homem da esperança. Ele mesmo sente as angústias dos seus irmãos e as compreende a partir do desígnio e da vontade de Deus; e quando percebe que não sabe como resolvê-las entra mais profundamente nos caminhos insondáveis do Altíssimo que a todos ama e sobre todos derrama as suas bênçãos, ainda que tais bênçãos sejam distribuídas traçando o sinal da Santa Cruz sobre a humanidade. O padre é o homem que abençoa com a Cruz porque entrega ao mundo aquilo que recebeu: o Cristo crucificado, morto e ressuscitado para a nossa salvação. O padre não se dirige ao mundo como um ser estranho, ele é do mundo e está inserido nas entranhas da sociedade. Ele sabe que deve contribuir com o crescimento da sociedade. Porém, é consciente de que a sua maneira de contribuir com esse progresso se concretiza no realizar com a máxima perfeição possível o seu sagrado ministério de amor: formando as consciências com a Palavra de Deus, administrando os sacramentos e a todos dando testemunho da esperança da ressurreição.

Esse amor ao mundo não deve confundir-se, contudo, com o secularismo. No caso dos sacerdotes incardinados na Diocese, a sua secularidade deve também ser um dos traços configuradores da sua própria espiritualidade; essa secularidade – que implica em uma maneira própria de amar o mundo – é muito boa, mas deve ser bem administrada. Este “ser sacerdote secular” do padre diocesano sublinha que ele deve administrar com responsabilidade pessoal o amplo campo da liberdade que não lhe foi retirado pela ordenação sacerdotal. Entre outras coisas, deve evitar o aburguesamento, consciente da sua vocação à santidade no âmbito do próprio ministério sacerdotal, a imitação do Cristo que por nós se fez pobre e dos seus Apóstolos. Deve, de igual maneira, evitar tudo aquilo que vá contra o seu estado clerical consciente da grandiosidade da vocação à qual está chamado, ele deve transmitir Cristo aos seus irmãos, os homens e as mulheres, sendo ele mesmo “outro Cristo”, o “próprio Cristo”.

Neste sentido, isto é, para transmitir Cristo ao mundo, ganham especial importância outras palavras que o Concílio dirigiu aos padres e que têm fundamento nos textos de um grande sacerdote, homem cheio de virtudes humanas e cristãs, profundamente entregue à causa do Reino dos céus, como o foi São Paulo:
“Muito importam as virtudes que justamente se apreciam no convívio humano, como são a bondade, a sinceridade, a força de alma e a constância, o cuidado assíduo da justiça, a delicadeza, e outras que o Apóstolo Paulo recomenda quando diz: “Ocupai-vos em tudo o que é verdadeiro, nobre, justo, puro, amável, honroso, virtuoso ou que de qualquer modo mereça louvor” (Fl 4,8)” (PO 3).

Como já se disse, trata-se de virtudes que são apreciadas no convívio com os demais seres humanos. Mas não nos esqueçamos de que tais virtudes são frequentemente provadas e, então sim, passam a serem virtudes autenticamente trabalhadas. Como dizia um autor: “uma geração que não teve necessidade de esforçar-se para conseguir o que queria, não está preparada para a vida. Falta-lhe treinamento na resolução dos problemas. A sociedade permissiva estimula a conduta puramente espontânea, que não requer reflexão, cálculo, método, esforço, disciplina, ordem… Hoje não se fala de formação, mas de realização pessoal. E para realizar-se é preciso libertar-se de tudo o que custa, de tudo o que contraria o viver bem; desfrutar da vida sem pagar nenhum preço. Que espaço se está deixando para educar a vontade? Que oportunidades existem para desenvolver virtudes como a fortaleza, a firmeza e a sobriedade?” [Gerardo Castillo, (Nuestro Tiempo, julho-agosto 1988, págs. 98-101)].

Nesse sentido, pode ser interessante aquela historinha que relata a dificuldade de um pai, logo pela manhã, para acordar o seu filho. Bateu à porta do rapazinho dizendo-lhe: – Levanta, meu filho, que está na hora de ir para a escola!

Do outro lado da porta veio a voz sonolenta e irritada do filho: – Não vou levantar, pai. Primeiro, porque ainda é cedo e estou com muito sono. Segundo, porque eu não aguento mais aqueles meninos. E, terceiro, porque eu detesto aquela escola e não quero mais ir lá.

O pai tratou de rebater: – Você vai ter que levantar, sim, agora mesmo, e tratar de ir à escola. Primeiro, porque já são oito horas e ninguém tem culpa se você foi dormir mais tarde. Segundo, porque você não pode se portar como uma criança, pois já tem 38 anos. E terceiro, porque você é o diretor daquela escola!

Caríssimos irmãos sacerdotes, somos nós os “diretores” desta escola de santidade e de apostolado que é a Igreja: temos que levantar-nos! Trabalhemos em nossas vidas o amplo horizonte das virtudes humanas, dessas disposições que nos farão cada vez mais preparados para enfrentar com realismo e otimismo as situações da sociedade contemporânea, a qual habitamos e amamos.

Que Maria, Mãe de todos os sacerdotes, ajude a todos nós para que ao amar o mundo de maneira autêntica, não sejamos mundanos. Somente desta maneira seremos fiéis e felizes até o fim das nossas vidas, até que o Senhor nos chame para celebrarmos eternamente os eternos louvores na Pátria eterna.
Por fim, gostaria de dar graças a Deus pelo dom do sacerdócio à sua Igreja. Gostaria também de agradecer o trabalho abnegado e eficaz dos padres e dos diáconos nos mais diversos labores, nas paróquias e outros trabalhos pastorais. Exorto a todos os demais fiéis que tenham um entranhado amor aos seus padres, que rezem por eles e colaborem para que todos juntos cheguemos à Pátria celestial quando o Senhor nos chamar.

Dirijo-me também aos seminaristas, nossa alegria e nossa esperança. Sejam corajosos na resposta ao chamado de Deus. Preparem-se bem para o futuro ministério. Desde já trabalhem com empenho e boa vontade tudo que visa uma sólida preparação: humana, intelectual, espiritual, pastoral. Tempos difíceis que vivemos hoje postulam por sacerdotes com ideias claras e decisões duradouras. Na descrença generalizada no valor da fé e da vida, sejam pontos de referência e segurança para os homens e mulheres que buscam a felicidade.

Caros irmãos sacerdotes, diáconos, leigos, estamos perto do jubileu de ouro da abertura do Concílio Vaticano II. Poucos são entre vocês que viviam aqueles momentos. Poucos viram o entusiasmo dos bispos que voltaram do Concílio cheios de esperança para a autêntica renovação da Igreja, uma nova primavera da Igreja, sopro vivificador do Espírito Santo. Quem não presenciou, pode ser difícil apreciar a beleza e a profundidade das suas intuições e decisões. Procuremos conhecer a fundo seus documentos, suas intenções e conteúdos. Procuremos valorizar os seus frutos inquestionáveis.

“Dirijam-se a Galileia, eu vos encontrarei lá”. Com estas palavras Jesus se dirige a nós e nos encoraja: dirijam-se à Galileia do apostolado e da evangelização. Dirijam-se aos homens e às mulheres com confiança e autoridade. E eis que eu irei a vossa frente.

Agora, realizaremos o significativo rito da bênção e da consagração dos Santos Óleos. Junto com a renovação das promessas sacerdotais, este rito explica a razão porque estamos agora reunidos juntos como um único presbitério, em torno do bispo diocesano. Ao estender as nossas mãos sacerdotais sobre o Santo Óleo do Crisma, comunicaremos ao povo cristão o amor de Deus e o poder da graça santificante, que eleva e santifica os membros do Corpo Místico de Cristo através dos Sacramentos. Este poder nos foi dado para ser abundantemente exercido a favor das pessoas, na unidade da Igreja.

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo.

+ João Wilk,
Bispo Diocesano

 

 

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