MISSA DO CRISMA
“Desejo elevar a Deus, com toda a Igreja, um hino de louvor pelo testemunho de muitos irmãos e irmãs que, mesmo neste nosso tempo, deram a vida para comunicar a verdade do amor de Deus que nos foi revelado em Cristo crucificado e ressuscitado.”
Queridos Irmãos Sacerdotes e Diáconos,
Seminaristas, Religiosos(as)
Queridos representantes das Paróquias da nossa Diocese.
1. Estamos celebrando a Santa Eucaristia nesta manhã da Quinta-feira Santa em clima de alegria e com espírito elevado. Assim a Igreja quer, assim nós compreendemos. Dentro do Tríduo Sacro do mistério Pascal, celebramos o Eterno Sacerdócio de Jesus Cristo, ungido pelo Pai como Messias e Salvador, e a nossa participação nesse Sacerdócio de Cristo, ungidos com a graça do seu sacerdócio e da sua missão, na Igreja e para o bem do povo.
2. Nos reunimos entorno do altar, da Palavra e do Bispo Diocesano. Assim celebramos a nossa identidade e a nossa missão, pois o sacerdócio só pode ser vivido corretamente na consciência de fazer parte do Cristo e na imitação da sua total entrega ao Pai, para o bem da humanidade. Ouvimos o profeta Isaías e, depois, as mesmas palavras ditas por Jesus Cristo em Nazaré: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pois ele me ungiu, para anunciar a Boa Nova aos pobres: enviou-me para proclamar a libertação aos presos e, aos cegos, a recuperação da Vista; para dar a liberdade aos oprimidos e proclamar um ano de graça do Senhor” (Lc 4, 6-19). A unção de Cristo é a nossa unção; a missão de Cristo é a nossa missão!
3. Como introdução e inspiração da presente reflexão, escolhi as palavras do Santo Padre Bento XVI escritas na sua Exortação Apostólica “Verbum Domini”. O Papa agradece e canta um hino de louvor a Deus por aqueles que deram testemunho e deram a vida em nome do amor que Cristo, morto e ressuscitado, nos revelou da parte do Pai. Duas palavras, portanto, que merecem um hino de louvor: “dar testemunho” e “dar a vida”. É neste contexto que queria percorrer as passagens da renovação das nossas promessas sacerdotais para a qual seremos convidados em seguida.
4. Em primeiro lugar, a Igreja nos anuncia que somos portadores do eterno sacerdócio de Jesus Cristo que ele comunicou aos apóstolos e a nós. É um privilégio dos escolhidos no meio do Povo de Deus. Cumpre dizer que estamos na presença de uma verdade da fé, uma realidade teológica, e não de uma simples conveniência ou uma ocupação como tantas outras do mundo. A cada ano que passa, sentimos que somos diferentes. Podemos experimentar dentro de nós uma dupla reação e uma dupla sensação, diante desta verdade da fé, ou seja, da participação do sacerdócio redentor e mediador de Jesus Cristo: o desânimo e cansaço ou uma alegria cada vez mais profunda, cunhada muitas vezes pelas renúncias e sofrimentos, na fidelidade e na perseverança. Lembramos que as verdades da fé são exigentes e desconcertantes, e fogem da lógica e da compreensão humana. É por esse motivo que a Igreja nos convida a renovarmos as promessas que com tanta alegria fizemos no dia da nossa ordenação sacerdotal. É preciso ter fé para ser sacerdote! É preciso ter fé para ser sacerdote até o fim da vida.
5. Quando o Papa agradece aos discípulos e missionários de Jesus pelo testemunho, ele faz referência a diversos tipos de testemunhos ao longo da história cristã. O testemunho, ou “martiria”, é uma das dimensões pelas quais a Igreja realiza a sua missão, ao lado de “diakonia” (serviço), “leiturgia” (função de culto) e “koinonia” (a Igreja a serviço da comunidade e da comunhão). No entanto, todas essas dimensões perpassa uma e mais importante: em tudo isso dar testemunho.
A Igreja conhece muitíssimas formas de testemunho. A mais eloquente é o martírio carnal sofrido pelos Apóstolos, pelos mártires dos primeiros séculos e, coisas surpreendentes, pelos numerosos e autênticos mártires da fé nos tempos atuais, em diversas partes do mundo. Os santos, com a sua espiritualidade ou caridade.
Pessoalmente, o que me chama atenção é o testemunho dos numerosos sacerdotes, missionários, religiosos e religiosas, pela sua abnegação e esquecimento perante o mundo. Tantos túmulos de missionários disseminados pelo mundo afora: só restou o nome. Ninguém pergunta quem eram, de onde vieram, qual era a sua cultura ou a sua família. Com o seu aniquilamento se fizeram sementes silenciosas lançadas no solo das almas que guardaram no fundo da alma o seu labor e vivem a sua fé sem saber quem foi que a semeou. Ou aqueles missionários, que vieram de fora na sua juventude e voltaram às suas terras na idade de não poder trabalhar mais. Desconhecidos na origem, desconhecidos no fim. Pois, quem os lembra como corajosos missionários que partem para terras desconhecidas? E quem os conhece já velhos que fazem pena e esperam pacientemente a passagem para a casa do Pai? Ficou conhecido só por eles e por Deus o apostolado de meses e anos, dia após dia. Vivem identificados com o despojamento do Filho de Deus, que para o nosso bem se rebaixou e se fez obediente e obediente até a morte. Um ou outro nome se tornou conhecido e propagado, quem sabe, para ser como luzeiros que testemunham uma multidão de testemunhas silenciosas de Cristo e do Reino.
É bom lembrar disso, quando nos vem a tentação de desprezo, de pouco valor, de ser incompreendido ou ter frustradas as expectativas pessoais de uma visão ilusória da grandeza do sacerdócio, de que lá no mundo seria melhor ou valeria mais, de fazer e fazer sempre as mesmas coisas e não ver nenhum resultado, de fraqueza carnal momentânea e passageira…
6. A Igreja que pede a renovação das nossas promessas vai nos perguntar se ainda temos a mesma alegria de conformar-se a Cristo e esquecer-se de si mesmo, aquela motivação e emoção que fez cair lágrimas dos nossos olhos, que sentimos no dia da nossa ordenação sacerdotal. Como nos sentimos agora? Sentimos a mesma felicidade? Alegres? Fraternos? É uma alegria autêntica ou fingida? De cabeça erguida ou arrastando os pés? A alegria e a felicidade são a alma da nossa vida, pois por elas podemos medir o nível do sentido da nossa vida. Renovar as promessas, portanto, significa voltar ao manancial da nossa felicidade que, na nossa juventude, identificamos com o seguimento de Jesus Cristo na Igreja.
7. A Igreja vai nos lembrar a tarefa de sermos fiéis distribuidores dos mistérios divinos, pela missão de ensinar. Neste ponto, quero fazer a referência à Exortação papal sobre a Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja. O papa nos pede uma adequada e generosa valorização. O Papa diz: “pensando na importância da Palavra de Deus, surge a necessidade de melhorar a qualidade da homilia; de fato, esta constitui parte integrante da ação litúrgica, cuja função é favorecer uma compreensão e eficácia mais ampla da Palavra de Deus na vida dos fiéis”. Fala também da “sacramentalidade da Palavra”: É possível compreender a sacramentalidade da Palavra com a presença real de Cristo sob as espécies do pão e do vinho consagrados. Aproximando-nos do altar e participando no banquete eucarístico, comungamos realmente o corpo e o sangue de Cristo. A proclamação da Palavra de Deus na celebração comporta reconhecer que o próprio Cristo que se faz presente e se dirige a nós para ser acolhido”. E o Papa cita as palavras de São Jerônimo: “Eu penso que o Evangelho é o Corpo de Cristo. Penso que as santas Escrituras são o seu ensinamento. E quando ele fala comer a minha carne e beber o meu sangue, embora estas palavras se possam entender do Mistério eucarístico, todavia também a palavra da Escritura, o ensinamento de Deus, é verdadeiramente o corpo de Cristo e o seu sangue”.
Na mesma linha de pensamento, o Papa resgata o valor e a necessidade das celebrações da Palavra, onde ainda faltam os sacerdotes para dar a Eucaristia para as comunidades dos fiéis. O papa diz que elas são “ocasiões privilegiadas de encontro com o Senhor. Tal prática não pode deixar de trazer grande proveito aos fiéis, e deve considerar-se um elemento importante da pastoral litúrgica. A celebração da Palavra de Deus é vivamente recomenda nas comunidades onde não é possível, por causa da escassez de sacerdotes, celebrar o Sacrifício Eucarístico nos dias festivos de preceito (…). Assim, em tais situações, hão de favorecer-se celebrações da Palavra que alimentem a fé dos fiéis, mas evitando que as mesmas sejam confundidas com celebrações eucarísticas”.
8. O testemunho é a resposta concreta, segundo o coração de Cristo e do coração da Igreja, aos desafios de determinado momento ou situação. Seu apelo pode nascer diante da perseguição sistemática pelo ódio da fé, e termina em martírio; pode ser um ataque aos princípios do ensinamento cristão; pode ser uma afronta de quem não tem fé, pode ser um ato de caridade diante da miséria do outro, pode ser um ato de paciência, quando “mortos pelo cansaço”, somos solicitados por alguém que crê que o padre atende a qualquer hora. Mas o nome de testemunho, nos tempos presentes, é a PERSEVERANÇA e a SERIEDADE de viver os compromissos sagrados assumidos na hora do nosso “sim”. Com quanta facilidade cedemos às nossas fraquezas humanas, com que dificuldade aceitamos a necessidade da nossa conversão para melhor servir a Igreja, com que leviandade, após alguns anos de vida sacerdotal, tantos entre nós se desfazem da cruz que livremente assumiram, porque começaram a experimentar que a cruz de Cristo pesa e causa sofrimento…
Coragem, queridos irmãos sacerdotes e diáconos. “Não tenhais medo”, como foram as primeiras palavras do pontificado do Papa João Paulo II, cuja beatificação aguardamos dentro de poucos dias. Cristo que nos escolheu para sermos seus ministros, nos dará a força da sua graça, apesar das nossas fraquezas e limitações.
9. Por fim, queridos irmãos e irmãs, quero expressar a minha gratidão a todos vocês sacerdotes e diáconos do nosso presbitério diocesano. Um agradecimento especial pelo grandioso trabalho de atender as confissões dos fiéis em forma de mutirão nestes últimos dias. Mas isto seria pouco… Obrigado pelo entusiasmo, pela muita dedicação pastoral, pela vida espiritual que vocês levam a cada dia. E quero lhes pedir orações e empenho sério em prol das vocações sacerdotais e religiosas, para que Cristo e a Igreja tenham sempre o número suficiente de testemunhas ativas em forma de vida toda, doada à causa do Reino.
10. Obrigado também a vocês por serem meus colaboradores no cuidado pastoral que a Igreja confiou à minha pequenez e às minhas fraquezas físicas e espirituais. E me perdoem também. É por isso vos quero ainda mais como colaboradores dedicados e unidos na minha missão pastoral. Deus nos permite a fraqueza para quebrar o nosso orgulho, egoísmo, desejo de parecer grande, para manifestar a sua força e o seu poder. Elas é que devem mobilizar a vossa oração pelo bispo e o empenho para suprir a escassez de forças físicas ou a falta da grandiosidade humana esperada.
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
Dom João Wilk
Bispo de Anápolis.