Diocese de Anápolis

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Corpus Christi 2014

Jesus Eucarístico, dom do amor do Pai.

Amados irmãos e irmãs no amor eucarístico.

Paz a todos vocês!

A celebração deste ano da Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue do Senhor se inscreve na caminhada pastoral da nossa Diocese rumo ao Jubileu dos 50 anos da fundação da Diocese (outubro 2016). Escolhemos o Mistério da Santíssima Trindade para nos preparar espiritualmente a essa grande data e tirarmos devidos ensinamentos para a nossa aproximação a Deus, na nossa vida e na nossa missão.

Dediquemos, portanto, um pouco da nossa atenção ao insondável mistério da Santíssima Trindade, que, por sua vez, vai nos iluminar na contemplação da Santíssima Eucaristia.

A Santíssima Trindade, Deus Uno em Três Pessoas, é a principal verdade da nossa fé. É simples e é tudo na nossa religião; é um mistério insondável e imperscrutável para a nossa compreensão e a nossa percepção sensual. São Paulo Apóstolo, na Primeira Carta aos Cristãos da cidade de Corinto escreve assim: “Agora nós vemos num espelho, confusamente; mas, então, veremos face a face. Agora conheço apenas em parte, mas, então, conhecerei completamente” (1Cor 13, 12). É o mistério coberto como que com um véu, recluso à nossa compreensão, mas aberto para a nossa contemplação, à alma e ao coração, silenciosamente abertos para a perspectiva da eternidade. É um mistério, porém, que já nos foi dado conhecer, em parte e na medida da nossa capacidade, pela Revelação, nas linhas e entrelinhas da Sagrada Escritura e dos ensinamento de Jesus Cristo.

Na tentativa de aproximar-se a esse mistério, a história da Igreja conheceu muitos escritores, teólogos, místicos e artistas que tentaram, cada um à sua maneira, compreender nem que seja a mínima parte deste mistério.

Permitam-me, irmãos e irmãs, servir-me da profunda espiritualidade dos monges russos do século XIV, que expressaram a sua espiritualidade trinitária nas obras de arte chamadas ícones. Em especial, refiro-me ao famoso monge e artista André Rublev. A sua atividade espiritual e artística se realizou nos tempos turbulentos de guerras entre os Mongoís, chamados também Tártaros, e a Rússia. Compenetrado pela espiritualidade trinitária, Rublev e seus confrades monges, encorajavam o povo a vencer os horrores da guerra com a contemplação da Santíssima Trindade – Deus Amor. Da sua autoria é a mais famosa representação da Santíssima Trindade, inspirada no episódio bíblico descrito no Livro de Gênesis (Gn 18, 1-15), onde Abraão recebe, na sombra de um carvalho, em Mambré, três personagens, identificados pela tradição posterior como Três Pessoas da Santíssima Trindade. Os três ficam sentados sobre um estrado, na sombra, em torno de uma mesa, sobre a qual se encontra um cálice e um cordeiro. O pintor projeta nos três personagens a sua compreensão da Santíssima Trindade.

Os três têm elementos em comum: os seus traços são rigorosamente idênticos, como se fosse o mesmo representado três vezes. O mesmo rosto, o mesmo tipo de cabelos, o mesmo corpo alongado, as mesmas vestes, a mesma auréola. Todos três têm na mão um cetro, símbolo do poder divino, em forma de bastão de peregrinos pelo mundo. As vestes contém o azul, símbolo da divindade que os habita. É o mesmo Deus único, com a mesma natureza divina em três pessoas. Mas, os três estão em posições distintas: as cores, os gestos das mãos, a direção dos olhos.

No centro está a figura do Deus Filho, vestida como Cristo glorioso das pinturas das igrejas bizantinas, um Rei e Sacerdote. O seu olhar está voltado para esquerda, para a figura do Deus Pai, em silenciosa escuta. Do lado direito do quadro está o Espírito Santo, com a mão posta na mesa, o olhar pensativo, escutando a conversa do Pai e do Filho. O Pai é quem fala. As suas mãos estão em gesto de mestre, quem ensina e dá ordens. O Filho e o Espírito Santo inclinam-se perante o Pai, numa atitude de adoração. A postura do Pai é de majestade imutável e, por isso, centro do diálogo. É Ele quem gera eternamente o Filho. E o amor do Pai e do Filho é o Espírito Santo. Ele é a Origem, o Princípio sem princípio; é o Pai.

Mas qual seria o assunto da conversa? O pintor sugere a seguinte leitura. Em cima da mesa está posto um cálice e, dentro dele, uma figura de cordeiro sacrifical. É uma retomada do sacrifício de Isaac pelo Abraão e do futuro sacrifício do Deus Filho, em obra da salvação da humanidade – o sangue derramado na cruz – a Eucaristia. No estrado, debaixo dos pés, há uma brecha. Pode ser um detalhe estético, mas não é, pois na iconografia oriental nada é casual, tudo tem o significado. É uma abertura entre o céu e a terra. É por onde o Filho desce ao mundo e o mundo sobe para o céu. Portanto, o assunto da conversa entre as Três Pessoas da Santíssima Trindade é a obra da nossa Salvação, na qual o Pai é o autor, o Filho o executor e o Espírito Santo é o continuador.

Neste primeiro ano do Triênio Jubilar o nosso tema é a pessoa do Divino Pai Eterno. A leitura da obra artística acima, nos faz entender que o Deus Pai é a fonte da qual brota o amor infinito, voltado, de modo especial, ao bem da humanidade.

Jesus, na sua vida e no seu ensinamento sempre estava voltado para a pessoa do Pai. Dizia que Ele está no Pai e o Pai está Nele, que os dois são um. Ao Pai dirigia as suas orações. Dizia que a vontade do Pai é a sua vontade, o seu alimento. Que a sua missão é a missão do Pai: como o Pai me enviou, também eu vos envio. Ensinava que tudo que pedirmos ao Pai, em seu nome, o Pai o concederá. Ao Pai reza pela Igreja na Última Ceia. Ao Pai entrega o seu espírito, no último suspiro na cruz. Promete aos Apóstolos que pedirá ao Pai que lhes envie o Espírito Santo Consolador.

A nossa liturgia compreendeu esta ordem, formulando as orações de tal maneira que todo o nosso culto é um ato de adoração ao Pai, em Cristo e por Cristo, na unidade do Espírito Santo e as nossas súplicas também se dirigem ao Pai, por intercessão do Cristo, no amor do Espírito Santo.

A Eucaristia é o lugar central do culto cristão, no qual damos graças pelo amor do Pai por ter-nos enviado o seu Filho como Salvador. Agradecemos e suplicamos ao Pai pelas nossas necessidades diárias, aprendemos a atitude de escuta da vontade de Deus, estamos prontos para ir em missão, criando canais da graça por onde Deus possa chegar aos corações humanos e os mesmos pudessem chegar ao Pai. Aprendemos a ser irmãos, uma comunidade de amor, assim como o é a Santíssima Trindade.

Mais ainda, a exemplo dos santos monges contemplativos, que tinham fé que os horrores das guerras podem ser vencidos pela contemplação dos mistérios divinos, temos uma orientação clara de que nós também vencemos as nossas pequenas e grandes guerras contemplando a Santíssima Trindade. Contemplar a Santíssima Trindade é voltar o nosso olhar para o alto, para Deus, para as realidades sobrenaturais. A grande guerra de hoje não é só aquela com armas destruidoras, mas a guerra generalizada contra os valores, contra a dignidade da pessoa humana, contra a verdade, contra a vida indefesa, enfim, contra o próprio Deus e a sua Igreja. O homem esqueceu ou perdeu o costume de olhar para o alto. Olha só pelos lados, vê apenas horizonte humano, material, temporal.

Celebrar e adorar a Eucaristia, contemplar a Santíssima Trindade, praticar o verdadeiro culto, é aprender de novo e ensinar de novo a olhar para os valores sobrenaturais e lá buscar a sua realização e a plena felicidade, encontrar o verdadeiro sentido da vida.

As nossas obras de caridade, as nossas múltiplas devoções, o nosso engajamento pastoral precisam ser continuadas e intensificadas. Mas, para nada serviriam sem esta grande espiritualidade trinitária, sem um profundo mergulho no seu mistério de amor, sem uma fé nos valores sobrenaturais, sem o testemunho de que tudo deve ser voltado para Deus e tudo brotar de Deus, como de uma fonte. É a nossa vida. É a nossa missão!

Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo!

+ João Wilk, OFMConv.
19/06/2014

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